Os Jogos Olímpicos de 1972, em Munique, jamais serão lembrados pelas sete medalhas de ouro conquistadas por Mark Spitz, nadador estadunidense. Nem também pela decisão do basquete masculino, entre União Soviética e Estados Unidos, decidida nos segundos finais. Essa Olimpíada será sempre lembrada como aquela em que o grupo terrorista Setembro Negro invadiu o prédio onde estava alojada a delegação de Israel, mantendo-a refém. O plano de resgate foi frustrado e resultou na morte dos onze atletas israelenses.
Membro do Setembro Negro no atentado durante os jogos de 1972
Você, estimado leitor, deve estar aí se perguntando o porquê de o tema “terrorismo” ser abordado neste espaço. Em primeiro lugar, o terrorismo está cada vez mais presente em nosso cotidiano. O terrorismo hoje em dia é tema de inúmeros debates e políticas na sociedade e nas relações internacionais e, por tudo isso, o terrorismo também influencia o esporte. Como? Basta reler o exemplo do primeiro parágrafo, o mais evidente da história.
Nesta semana o esporte também foi “vítima” do terrorismo. Bom, em outras palavras, evitou ser a vítima, mas acabou também se tornando, antes mesmo de ter sido. Isso porque o rali mais importante do mundo, o Dakar (antes conhecido como Paris-Dakar) era para ter começado no dia 5 de janeiro, a partir de Lisboa, com destino ao Dacar, no Senegal. O seu trajeto passava, por além de Portugal, pela Espanha, Marrocos, Saara Ocidental e Mauritânia, até atingir a capital senegalesa. Dias antes do início da prova, quatro cidadãos franceses foram assassinados na Mauritânia (país em que se passava o percurso) e o serviço secreto francês descobriu planos de uma célula do Al Qaeda (responsável pelos atentados nas estações de Madri) para raptar pilotos do rali, especialmente os franceses. Com isso, a direção da prova foi informada e provavelmente as seguradoras do evento não resolveram correr o risco de serem fortemente prejudicadas com o provável seqüestro dos pilotos. Se tais seguradoras não garantiam então as condições dos pilotos, o rali foi cancelado. E muito bem cancelado. Se a prova deste ano fosse marcada pela atuação do Al Qaeda, muito provavelmente esta seria a última edição desta prova tão tradicional. A organização falhou no aspecto de não haver o tal “plano B”. Sabe-se que o trajeto passa por países que são brandos e coniventes com a presença dos grupos terroristas em seu território e, além disso, os países que mais têm pilotos na prova são França e Espanha, cujas políticas externas não agradam aos olhos destas organizações criminosas. Se assim era, seria necessário haver um percurso alternativo, para que o evento fosse realizado e os compromissos, realizados. São milhões de dólares perdidos e outros milhões que se deixam de ganhar, além de milhares de empregos, diretos e indiretos que se perdem ao longo de muitos quilômetros, até Dacar.
Jogadores do Iraque, campeão da Copa da Ásia em 2007
Depois de tudo isso, o terrorismo evita o esporte, no sentido de impedir, de acabar. O esporte também pode acabar com o terrorismo. Caso não queira ler devaneios ou ilusões, termine a leitura por aqui. Talvez o que a Real Federação Espanhola faz, que é permitir seleções regionais a jogar partidas amistosas com outros países (como por exemplo a Catalunha e o País Basco), parece correto. Assim acalmam-se os ânimos dos grupos separatistas e da ETA. Em uma outra situação, a conquista da Copa da Ásia pelo Iraque, em 2007, uniu em torno daquela seleção: curdos, xiitas, sunitas e cristãos. E o selecionado iraquiano tinha em seu plantel, membros de todos estes grupos citados. Não é preciso viver em Bagdá para dizer isso, mas não há dúvidas de que esta conquista levou ao povo iraquiano o sentimento de pertencer a uma nação, à percepção do outro como igual. Se fosse pela realização do rali e pelo bom andamento da prova, que dessem o direito ao Al Qaeda de ter uma equipe, e que vencessem! Oxalá Pequim (ou Beijing, como preferirem) e a África do Sul estejam preparadíssimos, porque tudo e mais um pouco ainda pode acontecer.
Bom seria se as nações (étnicamente, politicamente, geograficamente falando, etc) se unissem em prol da paz, assim como se unem em prol do esporte.